Por que D. Roosevelt antecipou o feriado de Ação de Graças em 1939?

Adilson S. Proença
3 min readApr 25, 2020

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Em macroeconomia, às vezes, gastar pode pode tirar um país do buraco.

******************************************************************QUESTÃO 4, cap. 33 | Mankiw’s Introduction to Economics (p.741)

Em 1939, quando a economia estadunidense ainda não estava plenamente recuperada da Grande Depressão, o presidente Roosevelt proclamou que o feriado de Ação de Graças seria antecipado em uma semana para que o período de compras que antecede o Natal pudesse ser mais longo. Explique o que o presidente estava tentando realizar usando o modelo da demanda e da oferta agregadas.

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A Grande Depressão da década de 1930 se seguiu à uma intensa crise no mercado de capitais estadunidense. Esta, depois do notório crash em outubro de 1929, reverberou-se pela economia e diferiu diversos choques de contração da demanda agregada, já que a maioria das famílias sem renda e consumindo menos.

Aqui estão alguns fatos sobre o estado geral da economia estadunidense no ponto mais agudo da crise:

(1) a taxa de desemprego era de 25% (ou que significada que um a cada quatro estadunidenses estava desempregado);

(2) Entre 1929 e 1933 o mercado de capitais havia contraído em incríveis 90%;

(3) Aproximadamente 11.000 bancos foram à bancarrota, fato que pulverizou cerca de um bilhão de Dólares. Isso destruiu as economias de dezenas de milhões de famílias;

(4) A renda da família média caiu cerca de 40% durante a depressão;

(5) Cerca de 300.000 empresas fecharam;

(6) Milhões de famílias perderam suas casas, porque não tinham como pagá-las mais.

Nesse cenário apocalítico, o que fazer? Depende da escola de pensamento econômico.

A escola clássica iria propor que nada fosse feito. A premissa aqui é que, dentro do seu próprio tempo, o mercado (ou seja, a economia) iria se ajustar às novas condições. Pretender concertar as coisas poderia piorar a situação. Enquanto escrevo este (25/04/2020) o mundo enfrenta uma pandemia que colocou-o de joelhos e travou a economia mundial com a mesma brutalidade com que o freio de mão para um carro. Como de costume, em épocas como esta reemergem os debates tradicionais entre aqueles que advogam uma atuação assertiva do Estado na economia com vistas a mitigar o impacto negativo — hoje, da pandemia, em 1939, dos efeitos causados pela crise do mercado de capitais.

Um acompanhamento minucioso da historiografia econômica disponível parece sugerir que jamais houve em grande escala experiências à la Hayek ou qualquer vertente do pensamento clássico de que o mercado se auto regula. Hoje, ao pensar nos severos impactos econômicos que a pandemia pode nos impor, parece ser fácil de entender porque em tempos de crise parece não haver liberais. É como machucar-se e rejeitar um remédio sob a expectativa de que o seu corpo fará o trabalho de recuperação.

Não sei se algo análogo à anatomia se verificaria na economia, uma vez que, como disse, parece que nunca ousamos nesse sentido. O fato é este: em meio ao turbilhão da década de 1930, um inglês já conhecido nos círculos econômicos propôs que o Estado poderia fazer uso de certas ferramentas para mitigar os impactos da crise. Era John M. Keynes. Keynesianismo é como hoje se chama a escola de pensamento econômico que segue sua linha de raciocínio.

Keynes não refutava totalmente as premissas clássicas, em particular a de que o mercado se auto regulava no longo prazo, mas contra isso Keynes dizia que no longo prazo estaríamos todos mortos. Para o inglês a saída poderia estar numa atuação mais assertiva do governo por meios de políticas monetária e fiscais. Isso significava adotar medidas que injetaria mais dinheiro na economia. Afinal, se fora a demanda agregada que tinha contraído e causado os anos mais agudos da depressão, ao garantir alguma liquidez na economia, é possível que as coisas caminhem em direção à normalidade.

Nesse sentido, a decisão de Roosevelt de antecipar o feriado de Ação de graças em uma semana para as compras mostrava apenas sua convergência em garantir um consumo maior (e por mais tempo) das famílias. Ao longos dos anos tem-se observado que o peso do consumo das famílias do desempenho econômico dos países costuma ser, dependendo do país, pelo menos de 50%. Disso podemos entender como eventos que levem a contrações da renda das famílias (como o desemprego) pode impactar seriamente um país.

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(1) dados da crise: https://www.ducksters.com/history/us_1900s/great_depression.php

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Adilson S. Proença

An International Relations degree holder; a language, history and economics aficionado; and a soon-to-be Economist who sees writing a thought-untangling act.